13 de junho de 2009

Lei Seca

Diário do Nordeste – 12/06/09

Matéria Especial: UM ANO DE LEI SECA

7.500 motoristas punidos no CE por dirigirem embriagados. No Ceará, as mortes por acidente de trânsito chegam a 1.400 no ano, sendo uma média de um por dia só na Capital

MARTA BRUNO Repórter

Caixa de texto: Próximo sábado (20) tem aniversário — mas sem bebida alcoólica.  É o primeiro ano de aplicação da Lei Seca, que só no Ceará já puniu 7.500 motoristas que dirigiam embriagados. Embora gestores do trânsito comemorem a tolerância zero, apenas 100 dos infratores flagrados tiveram as carteiras nacionais de habilitação suspensas. Significa que apenas 1,5% dos processos administrativos foram concluídos, e 7.400 motoristas autuados continuam dirigindo normalmente.

Além disso, o temor inicial se transformou em relaxamento para boa parte dos motoristas. Para esses, não adianta insistir no fato de que, no País, o trânsito mata a cada dois dias o equivalente às 224 vítimas do Airbus 330. No Ceará, os óbitos chegam a 1.400 no ano, sendo uma média de um por dia só na Capital.

Na opinião do superintendente do Departamento Estadual de Trânsito (Detran), João de Aguiar Pupo, a data é motivo de comemoração porque há dados que comprovam melhoria no comportamento do motorista. Um exemplo é a diminuição na procura de perícia de trânsito, o que sugere redução na quantidade de acidentes. Hoje, em média, são realizadas 20 perícias, enquanto há um ano variava entre 30 e 34.

Para Pupo, é preciso considerar que a frota de veículos no Estado cresce 10% ao ano. “É natural que, de um ano para o outro, haja mais acidentes, mais mortos. Esse índice é um crescimento alto para a frota”.

Contudo, para João Pupo, nas blitze é possível constatar uma mudança de comportamento. “No domingo, na volta do Icaraí ou da Praia do Futuro, a maioria dos veículos abordados é conduzida por mulheres, porque o filho bebeu, o genro, o marido”, afirma, destacando que o combate à alcoolemia não pode ser feito só pelo Detran, mas pela sociedade.

No Ceará, o trânsito mata 1.400 pessoas no ano. No Carnaval, por exemplo, o Estado concentrou um terço das apreensões de alcoolemia de todo o País. Foram 4 mil em um total de 12 mil. Hoje o Detran conta com 66 etilômetros (bafômetros), mas espera adquirir mais 100 ainda neste ano.

A idéia é, conforme antecipa Pupo, doar parte dos usados para municípios do Interior, que acumulam problemas que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) tentou resolver com a possibilidade de municipalização do trânsito. A questão é que, aqui, apenas 46 municípios têm o serviço de forma municipalizada. Isso sobrecarrega o trabalho do Detran, que não tem como manter a fiscalização em todo o Estado.

Dessa forma, é muito mais fácil, por exemplo, dirigir alcoolizado em uma cidade que não tem fiscais de trânsito. O Detran conta com 400 fiscais do órgão e outros 300 da Companhia de Policiamento Rodoviário (CPRV). Por semana, de acordo com Pupo, há 700 fiscais em campo.

No Ceará, o Detran obtém uma média de 250 a 260 exames de alcoolemia positivos por semana, trabalhando com 66 bafômetros. Nos primeiros meses de implantação da lei, havia apenas quatro.

Desde que a lei começou a ser aplicada, no Estado foram instalados 7.500 procedimentos administrativos no Detran. Porém, como a punição é severa (multa de R$ 955 e suspensão de pelo menos um ano da carteira de motorista), o comportamento do infrator também mudou. “Agora essas pessoas vêm com advogado, recorrem à Jari ou ao Cetran (Conselho Estadual de Trânsito)”.

Prova disso é que, dos procedimentos instaurados, apenas 100 foram concluídos. “A gente encara isso da seguinte forma: a pessoa pode até recorrer. Mas todo mundo renova a carteira a cada cinco anos, pelo menos”, diz. Se o processo for concluído, e o motorista não devolver a carteira, daqui a dois ou três anos ela vai tentar renovar e não vai conseguir, porque vai ter que cumprir a suspensão.

Antes da Lei Federal Nº 11.705/08, dirigir alcoolizado culminava em multa gravíssima e processo de suspensão do direito de dirigir por até um ano. A diferença é que hoje é o prazo começa com 12 meses. Além disso, a infração passou a ser considerada criminalização, ou seja, o infrator, além da sanção administrativa, sofre processo criminal, a partir de denúncia impetrada pelo Ministério Público Estadual (se em vias municipais ou estaduais) ou pelo Federal.

FISCALIZAÇÃO

Infrações nas rodovias federais no Estado estão aumentando. A aplicação de multas nas rodovias federais vem crescendo, a despeito da fiscalização mais intensa desde que a Lei Seca foi implementada. Só neste ano, nas BRs no Ceará, foram aplicadas 155 multas relativas à condução de veículos por condutores alcoolizados. O número de infrações cresce mês a mês.

Em janeiro, segundo dados da Polícia Rodoviária Federal (PRF), foram autuados 16 motoristas pelo mesmo motivo. Em fevereiro, o número saltou para 28, sendo que em março o aumento foi três vezes maior do que no começo do ano, chegando a 59. Em abril, contudo, houve decréscimo para 52.

“A gente tem intensificado a fiscalização nos últimos meses, do começo do ano para cá”, atribui o chefe da seção de Policiamento e Fiscalização da PRF, Stênio Pires. Nos seis últimos meses do ano passado, foram aplicadas 155 autuações, a mesma quantidade dos quatro primeiros meses deste ano.

O inspetor federal acredita que o acréscimo se deve ao aumento da fiscalização. Por dia, a PRF realiza mais de 150 testes, sendo 4.500 no mês e quase dez mil só em 2009. No começo do ano, a média mensal era de 3 mil testes.

“É natural que haja um relaxamento, mas não voltamos aos patamares anteriores à legislação. A gente percebe que a população está mais consciente. O que tem que ser feito são campanhas constantes. Há muitos condutores que são preocupados, que fazem carona amiga, mas não são todos”, analisa o inspetor.

Até 20 de junho de 2008, não havia a criminalização para quem conduzia alcoolizado, a não ser que o motorista se envolvesse em um acidente. Com a lei, houve agitação em torno do tema, e os órgãos de trânsito não estavam preparados para lidar com a situação. Tanto que a população não sentia que a fiscalização era rigorosa, como avalia Stênio Pires.

Bafômetros

Do final do ano para cá, os órgãos fizeram licitações para comprar bafômetros e intensificaram o monitoramento. No Ceará, a PRF tem 17 bafômetros, um para cada viatura. A previsão, segundo Pires, é receber de cinco a dez novos equipamentos até o começo de julho, para o trabalho melhorar na alta estação.

Com isso, os novos etilômetros poderão substituir aqueles que estiverem sendo aferidos ou com problemas técnicos. “Assim não haverá interrupção, porque teremos mais aparelhos para substituir”, diz. De ano em ano os bafômetros precisam ser aferidos, o que ocorre em geral por duas semanas. No momento, três aparelhos passam pelo processo, mas a expectativa é que em 1º de julho todos estejam funcionando, fora os outros que serão adquiridos.

Stênio Pires ressalta que a PRF mantém constante trabalho educativo em escolas. A corporação também realiza fiscalizações educativas. Nos comandos são diários, os policiais convidam motoristas a conhecerem o equipamento.

SAÚDE PÚBLICA

Considerados epidemia por uns e problema de saúde pública por outros, os acidentes de trânsito preocupam o setor médico. Tanto que as estatísticas no Instituto Doutor José Frota, para onde vai a maioria das vítimas desses acidentes, não pára de crescer.

De 1º de junho de 2008 a 31 de maio deste ano, os atendimentos relativos às ocorrências somaram 12.156 casos. No período, os meses de maior incidência foram agosto (1.132 atendimentos) e dezembro (1.265). Neste ano, os meses de fevereiro, março e abril mantiveram média menor, de 870 atendimentos em 30 dias. Já em maio, o número voltou a crescer, 961 casos.

No ano anterior à implantação da lei, o número foi maior — 12.986 atendimentos por acidente. Mas como a lei é considerada rigorosa pelos motoristas, para indicar uma mudança de postura, esperava-se decréscimo maior.

Para o coordenador estadual de Urgência e Emergência do Estado, Frederico Arnaud, entre os condutores, o problema é maior para os motociclistas. “São 500 pacientes que morrem no IJF em decorrência de acidentes de modo”.

FORMAÇÃO DO CONDUTOR

Processo deve começar na Educação Infantil. Não é por acaso que as ações de conscientização para o trânsito devem se voltar para as escolas. Palestras para adolescentes, brincadeiras com crianças, simulação de situações do cotidiano. Tudo isso serve de base para a formação do condutor. E não tanto a longo prazo, já que a maioria das ocorrências é com jovens que aproveitam o fim de semana para sair, beber e dirigir.

A faixa etária que mais preocupa é entre 18 e 29 anos, segundo a chefe da Divisão de Educação da Autarquia Municipal de Trânsito, Serviços Públicos e de Cidadania de Fortaleza (AMC), Sheyla Fontenele. Por isso, para ela, é preciso trabalhar a educação para o trânsito ainda na infância e intensificar o processo entre jovens.

“Crianças e adolescentes são futuros usuários da malha viária. Daqui a pouco aquele menino vai ser ciclista, condutor, pedestre”, justifica. Por isso, frisa, é preciso “que se perceba o quanto é importante conduzir veículo motorizado de modo responsável”.

Em Fortaleza, é registrado em média um óbito por dia, o que torna a cidade a quarta Capital em acidentes de trânsito no Brasil. De janeiro a setembro do ano passado, a Autarquia de Trânsito registrou um acidente a cada 21,8 minutos; um com vítima a cada 62,7 minutos e um com morte a cada 1,12 dia. A maior vítima é o pedestre. No período, morreu um a cada 2,8 dias e um motociclista a cada 4,6 dias.

A maioria está na faixa dos 18 a 30 anos. “O jovem é quem está sofrendo mais. Essa mensagem educacional não está chegando às escolas, porque aos 18 ele deveria ter uma atitude mais consciente”, afirma Sheyla Fontenele.

Apesar disso, Fortaleza é a única Capital brasileira com três escolas de trânsito — duas da AMC e uma do Detran.

INFRAÇÕES

155 multas foram aplicadas só este ano nas BRs do Ceará

16 motoristas foram autuados no mês de janeiro

28 multas foram aplicadas pela Polícia Rodoviária Federal em fevereiro

59 motoristas foram pegos pela PRF, em março, dirigindo embriagados

52 multas foram aplicadas no mês de abril

3 comentários:

  1. Bom, só pra começar, a lei seca só é eficaz caso haja fiscalização ostensiva, buscando inibir quem comete a infração e fazer com que outras pessoas procurem não fazê-lo. O grande problema é a falta de estrutura de alguns órgãos de trânsito, em quaisquer esferas, pois, para tal fiscalização ser otimizada, eles todos deveriam ter e portar etilômetro, popularmente conhecido como bafômetro. E ainda existe a máfia de alguns fiscalizadores, sejam agentes ou policiais, guardas... Analisando a estatística de suspensão do direito de dirigir fornecidas às pessoas, podemos ter noção de como a coisa tem andado... É como se fosse mais um amparo para quem quer conseguir algo ($$). Infelizmente no Brasil é assim, agora vejam o caso do policial americano, que atua por excesso de velocidade a todo momento, no caso dessa semana, eles detectaram esse excesso por parte de uma idosa, e aplicaram a lei deles de forma igualitária, visto que ela tentou evadir. Enfim, não dá para comparar mamão docinho com abacate estragado (no caso acho que nós seríamos o abacate, rs)

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  2. A "lei seca" é mais uma lei para tentar colocar limites as pessoas imprudentes. Agora como a Fabiana falou a palavra chave é fiscalização.
    Não sou a favor da criação de mil regras, mas as vezes só minimiza os problemas com tais regras.

    Faz Parte!

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  3. Eu acho que mais uma vez o problema é bom senso dos condutores, dos fiscalizadores... Pq como foi dito na reportagem há diversos problemas com o cumprimento da Lei seca! mais uma lei pra se reclamar, tentar burlar, ver se a lei "pega" ou não, coisa de Brasil neh!!!Acho que tudo, com embasamento tecnico e de bem, que for feito para reduzir essa imensidão de mortes, é válido. Outro ponto importante é a impunidade, como a reporte colocou tem que ser feito desde pequeno, para que pessoas adultas não se comportem como crianças mais tarde tentando fugir do erro, e a mamãe deles são os advogados, o $$, entre outros.

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