Artigo publicado no Jornal do Commercio de hoje (08/04) de Recife acerca do desmonte da maior empresa do Nordeste, a Chesf.
Mais uma vez temos um exemplo do que há de pior na nossa política, em prol de governabilidade, alianças, eleições.
Acompanhem!
ARTIGO
Publicado em 08.04.2010
Como nas grandes tragédias, não há apenas um motivo para justificar o desmonte da Chesf, a maior empresa do Nordeste, celeiro de técnicos competentes e grande formuladora de políticas para o desenvolvimento da região. São muitas as razões. Complexas, intrincadas, obscuras. Envolvem interesses que vão muito, muito além de uma empresa de energia elétrica. Aos fatos:
Antes de mais nada é preciso dizer que quem manda no setor elétrico brasileiro é o senador José Sarney, do PMDB. Ele é o padrinho político dos ex-ministros de Minas e Energia Silas Rondeau e Edison Lobão. Ele é o suporte político de José Antônio Muniz, engenheiro maranhense que foi presidente interino da Chesf durante dois meses em 1993. Os de boa memória se lembram de uma cena que rodou o mundo quatro anos antes de seu interinato. Em 1989, último ano do governo Sarney, José Antônio, então diretor da Eletronorte, em plena Amazônia, tentava explicar a um grupo de índios a importância da construção de uma hidrelétrica no Rio Xingu, no Pará. A caiapó Tuíra, indignada com o projeto, aproximou-se e num violento gesto de ameaça esfregou seu facão no rosto do engenheiro. José Antônio safou-se da investida, cresceu politicamente, tentou privatizar a Chesf em 2002 (governo FHC) dividindo-a em três empresas e desde março de 2008 é presidente da Eletrobras, controladora da Chesf, Furnas, Eletronorte e Eletrosul.
José Antônio é, portanto, o condutor do processo que transfere do Recife para o Rio de Janeiro todas as decisões que envolvem a Chesf. E esta é a raiz de todo esvaziamento.
“Com a nomeação de José Antônio Muniz Lopes para a presidência da Eletrobras, Sarney tem o poder total no setor elétrico, de alto a baixo”, diz Lúcio Flávio Pinto, editor do Jornal Pessoal, de Belém. A declaração está em Honoráveis Bandidos – Um retrato do Brasil na era Sarney, livro escrito no ano passado pelo jornalista Palmério Dória.
Hoje, sempre que questionado sobre o processo de esvaziamento da Chesf, José Antônio nega a possibilidade e afirma que, na realidade, está fortalecendo a Eletrobras e, assim, cumprindo a ordem do presidente Lula de transformar a holding energética numa grande Petrobras do setor elétrico.
Mas a operação é curiosa a começar pelos números. A Eletrobras lucrou no ano passado R$ 170 milhões. A Chesf, R$ 764 milhões. É um caso interessante de uma “filial” que ganha quase cinco vez mais que a “matriz”. Outra controlada importante, Furnas, por sua vez, fechou o ano passado com um prejuízo de R$ 129 milhões. Já a Eletronorte está quebrada. Após oito anos (governos FHC) sob o comando do próprio José Antônio, amarga um passivo de mais R$ 8 bilhões. A Eletrosul, outra sob o guarda-chuva da Eletrobras, só opera com transmissão. Não gera energia e, por isso, não tem tanta atratividade.
Diante de um quadro deste, no momento em que a Eletrobras comandada por José Antônio, Lobão e Sarney quis se transformar numa megacompanhia global (digamos que seja apenas este o interesse), qual é a subsidiária considerada o filé, a joia da coroa, a empresa que poderia atrapalhar seus planos se não estivesse sob seu controle? A Chesf, naturalmente. E os tentáculos do PMDB abraçaram a companhia nordestina.
Como em Crônica de uma Morte Anunciada, de Gabriel Garcia Marquez, todo mundo sabia que haveria um assassinato. E ninguém fez nada. Um esperou pelo outro, a preguiça se estabeleceu, estavam todos tão ocupados, tanto interesse em jogo e Santiago Nasar foi morto pelos irmãos Vicário.
A morte da autonomia da Chesf aconteceu em 11 de julho do ano passado, quando o seu conselho de administração, na reunião de número 150, aceitou a decisão da Eletrobras de concentrar tudo na sede do Rio. Ninguém fez nada, ninguém abriu a boca. Uns ficaram calados por interesse, outros por desconhecer as reais implicações daquela reunião.
E eis que no mês passado começaram a chegar os novos crachás, a nova marca com logotipo estilizado da holding se sobrepondo ao da subsidiária. Aqui e ali surgiram algumas vozes contrárias à mudança. Infelizmente, nada ainda a altura da gravidade desta transferência de poder.
Aproveitando-se da passividade reinante no meio político, o Ministério de Minas e Energia e a Eletrobras – agora soberana em tudo – inseriram o Artigo 22 na Lei 11.943/2009, sancionada por Lula em 28 de maio passado. A Chesf, então, foi “autorizada” a prorrogar até 2015 contratos de venda de energia que venceriam este ano. O que isso significa? Um prejuízo de R$ 350 milhões, no mínimo. Logo abaixo eu explico. Antes, vale dizer que técnicos da Chesf alertaram a Eletrobras para a perda que a subsidiária teria. Também lembraram que não havia amparo jurídico. E o que foi feito? Antes de sua iminente saída, em 12 de março passado, Lobão (o homem de Sarney) conversa com Lula e o presidente assina o Decreto 7.119. Tudo foi regulamentado.
Na prática, a canetada proíbe a Chesf de renegociar contratos com sete empresas que compram energia diretamente à companhia nordestina. Antes que os contratos vencessem – e portanto fossem reajustados – o Ministério articulou a renovação deles com os preços antigos. Se o caminho seguido fosse o correto, a Chesf leiloaria a energia e possivelmente ganharia mais com a venda de seu produto. Mas, não. Com a operação, saíram ganhando Vale, Braskem, Dow Química, Gerdau, Caraíba Metais, Novelis e Ferbasa, empresas que certamente serão gratas à bondade de Sarney, Lobão e José Antônio. E à de Lula, não vamos esquecer.
Ora e por que ninguém fez nada? Onde estavam, onde estão nossas lideranças?
Pelo que se pode depreender, a necessidade pragmática de se preservar a grande aliança PT/PMDB falou mais alto. Na lógica dos governistas, o grupo de Sarney garante a governabilidade no Legislativo e, mais importante ainda, fortalece eleitoralmente a candidata Dilma Rousseff à Presidência. O braço direito de Dilma se chama Erenice Guerra, que agora é ministra da Casa Civil. Erenice integra o conselho de administração da Chesf, presenciou a reunião de 11 de julho de 2009 e aprovou tudo.
Sendo assim, por que Eduardo Campos, ainda que sendo do PSB, se insurgiria contra o acordo que pavimenta a candidatura de Dilma? Ora, Dilma é candidata de Lula e Lula apoia Eduardo. A mesma lógica vale para outras lideranças que se não ficaram caladas com o desmantelamento da Chesf, adotaram um posicionamento pífio e tardio, como o de Eduardo.
Bom, e na própria Chesf, por que ninguém falou nada? Cadê os funcionários, cadê a diretoria, cadê todo mundo que brigou contra a tentativa de privatização em 2002? Por partes:
A diretoria não fez nada porque é frágil e dividida. Não tem vez nem voz. Ninguém se entende. Há casos de diretor que não fala com o colega da sala ao lado. O presidente Dilton Da Conti, embora tenho sido indicado pelo PSB de Eduardo, não tem prestígio com o governador. Eduardo e Dilton têm uma relação conflituosa por questões que remontam à operação dos precatórios (1996), depois à eleição de 2002 e, mais recentemente, ao pleito eleitoral de 2006. Não é de se estranhar que Eduardo dê de ombros à sorte de Dilton de, isolado, tentar explicar o inexplicável.
Em 2003, início do governo Lula, além de Dilton, o PSB indicou João Bosco de Almeida para o cargo de diretor-administrativo e Marcos Cerqueira, para a diretoria-financeira. Tamanho é o descaso de Eduardo com a Chesf e com Dilton que, assumindo o governo de Pernambuco em 2007, sacou Bosco para a Compesa e nem se deu o trabalho de indicar outro nome para o lugar vago na empresa de energia. A cadeira ficou vazia durante três anos. Foi então que o PMDB ocupou o vácuo, indicando José Pedro de Alcântara, ligado ao senador Renan Calheiros, do PMDB. Já Cerqueira, também do PSB, segundo uma fonte do setor, deve ter pensado: “Se nem Dilton nem Eduardo fazem nada. Por que eu vou fazer?” Por sua vez, José Ailton de Lima, diretor de engenharia, é do PT. E o PT lá em cima quer ficar com o PMDB, partido que abocanhou a Chesf. Calou-se José Ailton. O mesmo aconteceu com Mozart Arnaud, homem ligado a Dilma Rousseff.
Os funcionários – com as honrosas exceções de praxe – calaram-se por um motivo mais concreto: aumento salarial. Ser do quadro da Eletrobras garante um contracheque mais alto do que ser da Chesf. Some-se a isso a juventude do quadro que, diferentemente daqueles mais antigos, não valorizam muito a estatal como uma planejadora, uma indutora do desenvolvimento regional. Funcionários satisfeitos, sindicato quase inerte.
Pronto, bastidores contados, a grande pá de cal ainda está por vir. Em 2015, vencerão as concessões para que a Chesf opere suas hidrelétricas, com exceção de Sobradinho. Se nada for feito, o mais provável é que haja também uma transferência, agora não mais de poder - uma transferência operacional mesmo – para a Eletrobras. Acontecendo isso, a Chesf, que já virou um mero escritório, se limitará a ser apenas parte da história.
Bem um assunto bem polêmico e que dá vontade de falar, no caso escrever, vamos lá:
ResponderExcluir- José Sarney: Esse cidadão não comanda só o setor elétrico, só o Maranhão, só Amapá, só o legislativo ele tem gente espalhada por todas as áreas! Porque será que ele não foi cassado?
Se Sarney comanda o Setor elétrico, ele tem alguma relação com a presidenta Dilma? Vale lembrar que Dilma foi ministra das minas e energia, não sei se o autor do texto resolveu preservar isso ou não importava. Para mim importa, pois querem fazer a Dilma de santa e o Serra de privatizador e Terrotista, os dois não são nenhuma coisa, nem outra e sim PÉSSIMOS CANDIDATOS!
- Decreto : O decreto assinado por Lula até onde é legal? Decreto foi feito para causas urgentes, de emergência, calamidade pública,...
Decreto e Medida provisória tem que ser bastante analisadas e ponderadas antes de assiná-las, senão vira o que chamamos de CANETADA!
É triste! A política pelo menos esse ano não será tão interessante, aqui no Ceará Cid Gomes ganhará com quase 60% dos votos e o segundo lugar será BRANCO/NULO e em terceiro Soraya Tupinambá (PSOL). É SÉRIO! Esse é o cenário do Ceará, se isso não for o denominado coronelismo moderno não sei o que é, Cid Gomes destruiu a oposição!
Para finalizar ( texto muito longo...), por isso que quando se fala em PRIVATIZAÇÃO tem que ser feito um estudo técnico, pois em certos casos pode não ser tão ruim e em outros não é tão bom!
O governo ao invés de ter empresas poderia ser mais forte na regulação e fiscalização dos setores vitais para o desenvolvimento sustentável do país.
É isso! Muito bom o assunto e o texto, apesar das notícias do dia a dia não tinha encontrado ao que desse vontade de escrever!
Valeu Diego e vamos discutir!!!
O sentimento dentro da empresa hoje é que realmente não se tem condições mais de retroceder neste processo de Transformação da Eletrobras. Quando eles eram os únicos a saber do que ocorria nos bastidores do poder dentro da empresa, não fizeram nada. Aprovaram tudo, nada disseram, não se opuseram. O sindicato, que eu não preciso dizer a quem está ligado, não se pronunciou.
ResponderExcluirQuando, infelizmente, a parte que pesa no que tange aos empregados, que é o Plano de Carreira e Remuneração, a transparência foi mínima, e quem nos informava era a rádio peão. E contar com informação de rádio peão é complicado. Quando vem a informação oficial, vê-se o monstrengo.
Um movimento dos novatos permitiu o recolhimento de mais de 800 assinaturas em uma semana num abaixo-assinado heróico direcionado a diretoria da empresa e ao presidente da Eletrobras mostrando as distorções do novo plano e pedindo o mínimo: explicações, motivos.
O sindicato entao começa a fazer cena. Os políticos então começam a fazer cena. Por que não se moveram antes??? E por que se movem agora???
Eu tenho mais é que ter cuidado com o que eu digo, embora todo mundo saiba disso.
É meu amigo Rhennier, pode deixar que a parte de descer as palavras em qq um eu faço!
ResponderExcluirEsses problemas cada vez que você acompanha mais de perto, mais nojo vc tem!
A politicagem e o nível da população, de modo geral, produzem esse contexto que vivemos!